quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

“Concordo com Dom Quixote: o meu repouso é a batalha.”
- Pablo Picasso -


sábado, 16 de janeiro de 2010


Escritos de luz invadem a sombra, mais prodigiosos do que meteoros.
A alta cidade irreconhecível avança sobre o campo.
Seguro da minha vida e da minha morte, contemplo os ambiciosos e desejo entendê-los.
O seu dia é ávido como o laço no ar.
A sua noite é a trégua da ira no ferro, pronto a acometer.
Falam de humanidade.
A minha humanidade está em sentir que somos vozes de uma mesma penúria.
Falam de pátria.
A minha pátria é um palpitar de guitarra, uns retratos e uma velha espada, a prece clara do salgueiral ao entardecer.
O tempo vive-me.
Mais silencioso do que a minha sombra, cruzo o tumulto da sua exaltada cobiça.
Eles são imprescindíveis, únicos, merecedores do amanhã.
O meu nome é alguém e qualquer um.
Caminho com lentidão, como quem vem de tão longe que não tem esperança de chegar.

A arrogância da quietude - Jorge Luis Borges
(epígrafe de “A Herança do Vazio” de Kiran Desai)


sexta-feira, 8 de janeiro de 2010


"Férmin piscou-me um olho.

- Essa mulher é um vulcão à beira da erupção, com uma libido de magma ígneo e um coração de santa – disse ele, envaidecido. – Para estabelecer um paralelo de verdade, lembra-me a minha mulatinha de Havana, que era uma santeira muito devota. Mas, como eu no fundo sou um cavalheiro à moda antiga, não me aproveitei dela e me conformei com um casto beijo na bochecha. Porque não estou com pressa, sabe? A espera aumenta o desejo. Tem uns bobalhões por aí que acham que, se põem a mão na bunda de uma mulher e ela não reclama, já está no papo. Aprendizes. O coração de uma mulher é um labirinto de sutilezas que desafia a mente grosseira do homem trapaceiro. Para realmente possuir uma mulher, é preciso pensar como ela, e a primeira coisa a fazer é ganhar sua alma. O resto, o doce e fofo embrulho que nos faz perder os sentidos e a virtude, vem por acréscimo.




Aplaudi seu discurso com solenidade.

- Fermín, você é um poeta.

- Não, eu estou com Ortega e sou um pragmático, porque a poesia mente, embora de forma bonita, e o que eu digo é mais verdade do que pão com tomate. Já dizia o mestre, mostre-me um mulherengo e eu lhe mostro um homossexual disfarçado.O meu negócio é a permanência, o perene. Você será minha testemunha de que farei de Bernarda uma mulher, se não de respeito, que isso ela já é, ao menos feliz.
Sorri-lhe, assentindo. Seu entusiasmo era contagiante, e sua métrica invencível...."

Pág.111~112
A Sombra do Vento
Carlos Ruiz Zafón.









Férmin, te espero.
Me encontra ou deixa eu te encontrar.